Desencontro (s)
Não é que não me preocupe com os “porquês”, é
mais com o “como”. Como posso? Como faço para querer apenas um pouco? Ou menos,
ou com mais calma, ou devagar?
Como alguém que esteve privado de seu alimento primordial,
tento consumir, de uma vez só, o que me faz me sentir viva.
Forte, você diria, eu andar por aí sem me
sentir viva.
Mas é que há tantas cores nos detalhes das lembranças dos poucos
momentos que tivemos neste nosso encontro, re-encontro, que me fazem crer que
eu andava por aí sem perceber os sabores, as possibilidades, eu apenas
continuei andando.
Na minha imensa pressa, é isso, pressa, invariavelmente
me atrapalho, atropelo. Me machuco e é provável que os envolvidos no atropelo
também se machuquem. Mas sei que em mim, dói. Dói a dor de ter batido e dói a ter deixado a
cena do atropelo, sem perguntar sobre quem mais ficou ferido.
Qualquer um que me tivesse ouvido,
principalmente o que eu não digo, perguntaria para a minha difícil criança
interior - mas afinal o que queres?
Paro
por uns instantes e observo. Percebo com toda a perplexidade, que o que parece
simples se reverte em emaranhados de mágoas e sai como um tiro.
É provável que eu também te entenda mal. Suas
palavras me caem como facas que recortam pequenos filetes do que eu ansiava.
Ouvir dizer – “não quero estar com você”-
causa um misto de náusea e tremor eu percorrem meu corpo, segundos antes
do meu sistema de autodefesa se armar e lidar como essa evidência que me
dilacera. E retomo ao “como”. Como isso
é possível? Como pude entender errado? Como poderia fazer diferente?
Mas não há tempo, e o terror de ser rejeitada me
sufoca e antecipa a minha reação, apenas digo.
Minhas palavras ditas, saem como um tiro. Talvez
por isso eu consiga falar mais claramente quando escrevo. Tomo um tempo, um ar,
volto a texto, lapido, reescrevo. E mesmo assim, ainda há sempre o que se
corrigir, você mesmo é um excelente revisor.
Quando eu falo, não há tempo, foi. E em geral é
desmesuradamente equivocado, ou o que falo, ou como me entendem.
Tento, algo em mim, silenciosamente diz...Espera,
me escute, esqueça o engodo no qual eu nos envolvi. Imponente, diante do que
sai de mim sem a calma, observo o enunciado afastar-se e muito do seu
endereçamento. É como resultado de uma fatalidade do atropelo, vejo você partir
depois de eu mesma pedir.
É essa sede imediata de viver, de entregar, em
cada possibilidade de encontro – o que eu tenho guardado, que se transforma em um trágico-cômico
paradoxo exorbitante – o que eu dou afasta quando deveria aproximar e desencontro
o que nem acreditara re-encontrar.
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